segunda-feira, 13 de julho de 2015

Ser e Estar

Uma das melhores características das línguas latinas, linguisticamente falando, é que temos dois verbos para caracterizar o que somos. Diferentemente das línguas germânicas, o inglês por exemplo, podemos diferenciar algo que é permanente, através do uso do verbo “ser”, de algo que é transitório, através do uso do verbo “estar”, sem grandes problemas ou construções gramaticais. 
Em inglês, por exemplo, a frase “You are sick” pode determinar que uma pessoa está com uma doença leve, como uma gripe, ou algo mais grave e irreversível, como um câncer em estado avançado. 
Ponto para os latinos.
Essa minha pequena reflexão linguística, hipotético leitor, me surgiu graças à uma conversa em rede social, essa praga virtual, que surgiu depois de uma piada, a qual eu acho muito sem graça, sobre torcedores do São Paulo e do Grêmio serem automaticamente tachado de gays, travestis e transgêneros. Durante a conversa eu soltei “você está sendo homofóbico”. 
A pessoa com quem conversava, pessoa muito letrada e politizada, por sinal, me acusou de estar acusando ela de ser homofóbica. Tal constatação me causou um espanto tremendo: será que eu não estava sendo claro com a minha expressão de algo transitório, afinal a pessoa, assim como eu, defende em muito os direitos à igualdade dos LGBT.
Quebrar preconceitos que nos são imputados desde os primórdios da nossa educação é um trabalho árduo que requer muita reflexão, muito diálogo, e até uma luta interna. O tempo, ah, o tempo, é implacável, o que hoje é aceitável como comportamento padrão daqui há alguns anos pode não ser mais. 
Assim como o contrário. Se retroagirmos vinte, trinta anos, ser gay era considerado obscenidade em muitos países, nesse quesito eu recomendo o longa O Jogo da Imitação, e era passível até com pena de morte, o que em muitos países onde impera a sharia ainda acontece.

Dessa forma, você pode não ser homofóbico, não ter ódio contra gays, lésbicas, travestis e transgêneros, mas pode estar homofóbico ao fazer uma piada ou ofender alguém dizendo, de forma preconceituosa e escarnecida, que ela é LGBT. 
Aliás, ofender alguém chamando-a de gay é passível apenas de desprezo, afinal ser gay não é, nem de longe, uma ofensa. Como disse, leva um bom e longo tempo para perdemos todos os preconceitos que temos, não importa o quão ilustrado, engajado na causa, e “mente aberta” somos,afinal o preconceito, o racismo, a etnofobia, o machismo, entre outros tipos de ódio, são todos construções sociais, culturais e pedagógicas, e demanda tempo e disponibilidade para quebrá-los, e é um processo cheio de fluxos e refluxos. Simplesmente cortá-los é uma tarefa, pelo menos, complicada.