sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Diário de um Professor: A Escola Tradicional e a Criatividade

Uma das grandes preocupações dos pais hoje em dia, no que tange à educação e a pedagogia, é a qualidade da escola que seus filhos frequentam. Querem uma escola forte, com uma forte preocupação com a disciplina e que seja um agente na inserção social das crianças. Esse é a definição, rasa, eu sei, de uma escola forte. De escola, enfim, tradicional. Há um detalhe nesse tipo de escola, nesse tipo de pedagogia, que é a padronização. A escola tradicional está calcada em ideias do Iluminismo que tendem ao universalismo do que ao individualismo, dessa forma esse tipo de escola faz com todos os alunos tenham o mesmo conteúdo, com o mesmo método, com o mesmo professor e, e aqui está um dos seus maiores equívocos, os alunos são avaliados da mesma forma contando com o mesmo peso para as matérias.
O grande problema desse tipo de avaliação é que há um escalonamento das matérias, elas tendem a se dividir em três grandes grupos: línguas e matemática, em primeiro plano, ciências sociais e naturais, em segundo plano, e, em terceiro plano, as artes e a educação física. Se você reparar, até a carga de aulas segue esse escalonamento.

A educação em massa, portanto, tem como objetivo formar pessoas que tenham domínio em sua língua materna, afinal uma língua estrangeira não é considerada uma matéria do primeiro escalão, e que tenham raciocínio lógico, depois de 12 anos de aprendizado matemático, o mínimo que se espera de um aluno é que eles tenham raciocínio lógico. Veja, essa não é a minha expectativa, mas é a proposta pedagógica desse modelo.
Agora peguemos uma criança que apresente alguma habilidade fora desse padrão, que apresente habilidades em artes e em algum esporte, por exemplo, o que a escola faz com essa criança? Nada... Acredito que não seja possível uma personalização total do sistema de ensino como um todo, porém, conseguiríamos fazer um ajuste dessa hierarquia, pensando em níveis não verticais, e sim horizontais, fazendo com que os alunos sejam avaliados, e portanto classificados, de maneira mais honesta e verdadeira, de acordo com a sua habilidade natural. Dessa forma evitaríamos que a experiência escolar, que deveria ser excitante e edificante, não se torne enfadonha e um peso, principalmente para aqueles alunos que apresentem um alto grau de criatividade, porque essa massificação e estratificação da educação torna a criatividade quase impraticável.
Quantos talentos não perdemos, nas mais diversas áreas, ao longo do caminho escolar sufocados em meio de tantas aulas de português e matemática? E mesmo para aqueles que são criativos - um erro muito comum entre nós é atribuir às artes a primazia da criatividade, porém um físico ou um químico não precisa de uma boa dose de criatividade nos seus ofícios? Um executivo que apresente novas formas, positivas, de gerenciamento não é criativo? - nessas duas áreas também não são desafiados a pensar de maneira nova e empolgante do que a velha forma de aulas expositivas, lição de casa e avaliação? Quantas pessoas que apresentam uma habilidade forte em português são desafiadas a serem escritores ou poetas, ou jornalistas?
Se formos a fundo nesse problema perceberemos que a raiz de todos esses amordaçamento do ensino se encontra fundamentado em dois grandes problemas: o uso social da escola, a escola pensando nos moldes iluministas tem como primazia a formação não de pessoas, mas sim de cidadãos, ou seja, pessoas inseridas dentro de um determinando sistema político-social, que saiba reconhecer os símbolos e a história de sua nação (já reparam o quanto o discurso das escolas é carregado de um nacionalismo frouxo?), e que saibam interagir adequadamente em sociedade, de acordo com as expectativas que essa tenha sobre os seus indivíduos; e segundo, o fetiche pelo desempenho escolar, ou seja, ter boas notas nas matérias de peso - eu, pelo menos, nunca vi ninguém elogiar o filho por ir bem em educação física ou artes; ou ainda o caminho contrário: buscar algum tipo de reforço escolar nessas matérias quando, por acaso cósmico, o aluno não apresenta o desempenho esperado (geralmente, o máximo possível). Esse fetiche pelo desempenho escolar, aliás, será tratado em um texto aqui em breve.
O que proponho não é uma mudança total no sistema tradicional de ensino, há muitas coisas boas nesse tipo de ensino, mas sim uma adequação para termos o mínimo de individualização, poderíamos apresentar diversos tipos de ensino, onde o aluno, orientado por pais e professores, pudesse escolher qual tipo de ensino lhe fosse mais adequado. Essa não é uma mudança fácil, pois ela passa por elementos que estão fora dos muros escolares, como a valorização do trabalho intelectual ante o trabalho manual, além de uma mudança do papel da escola: o que devemos ensinar para os nossos alunos e quais as nossas expectavas com a experiência escolar. Devemos formar pessoas, cidadãos ou profissionais?

Link:
Escolas Matam a Criatividade? – Palestra de Ken Robinson no TEDTalks: https://www.youtube.com/watch?v=aQym7WkF5ks

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